top of page

Nem menino, nem menina.
Simplesmente Gabo

Ao ser questionado sobre como ele se enxerga, Gabo fala com uma seriedade convicta: “eu tenho tanto gênero quanto uma batata”

Nome: Eros Gabriel Oliveira do Amaral

Idade: 20 anos

Pronomes: Ele/dele e Elu/delu

De onde é: Fortaleza - CE

Profissão: Ilustradore e quadrinista

Redes Sociais: @gaboseiras

Aos 6 anos, o atual estudante de Moda e quadrinista já fazia brincadeiras com fundo de verdade sobre não ser um menino nem uma menina, mas naquela época as informações sobre pessoas sem gênero ainda eram muito escassas, o que lhe deixou por algum tempo sem saber ao certo sua real identidade.

Sua caminhada de autodescobrimento e identificação, até chegar ao nível de se identificar como um legume em questões de gênero, se deu como um processo natural de crescimento de uma criança. Em seu caso, Gabo obteve algumas certezas desde cedo, enquanto outras não. Com 11 anos já sabia que era bissexual, com 13 já sabia que era trans. Contudo, as dificuldades para derrubar conceitos pré-definidos pela sociedade e por si mesmo tornam-se empecilhos no meio do caminho quando se tem uma cabeça ansiosa que somente se aquieta quando entende um quadro por completo.

Por ser não-binário, nunca foi visto como “normal” para a sociedade, uma vez que a quebra de padrões enraizados causa estranheza e incompreensão, mas ter sido uma criança, logo um adolescente, LGBT não foi a única questão fora da normalidade estabelecida. 

Finalmente reconhecer e admitir em voz alta que sua mente funcionava de forma diferente da maioria das pessoas ao seu redor, ao passar pela grande mudança de rotina ao ingressar na faculdade, foi motivo de grande alívio para Gabo.

Ele diz que não tem como falar de suas vivências como pessoa não-binária sem voltar-se para seu diagnóstico de autismo, apesar de seu entendimento como autista tenha vindo oficialmente apenas aos 18 anos, pois ambas as coisas fazem parte de seu ser desde sempre, são parte daquilo que o compõe como pessoa.

A realidade se mistura com a arte em sua existência. Com a crença de que possui uma veia artística herdada por Tarsila do Amaral, Gabo começou a desenhar a partir do momento que conseguiu segurar um lápis sem deixar que caísse. Desde que se entende por gente os desenhos fizeram parte do seu dia-a-dia, com rabiscos e rascunhos, descobriu que é possível transmitir coisas que nem ele mesmo conseguia colocar em palavras, buscando esse método para entender melhor a si próprio e fazer-se ser entendido para o público, porque a arte se trata disso, de uma comunicação que quebra as barreiras linguísticas e que transforma através da representação.

Portanto, a ideia de separar a arte do artista nunca fez sentido para si, porque sua arte não é nada mais do que uma extensão de seu ser.

"Por meio da arte, eu tô lá me colocando, e expressando", diz ele, da maneira mais identificável possível. 

"Eu sempre me enxerguei, na realidade, como um personagem de desenho animado. Por causa que, nos cartoons, mesmo quando tem algum personagem que claramente é um menino ou uma menina, você não pensa muito no gênero dele. Você pensa mais ‘ah, é só um bonequinho animado’, sabe?".

 

E gostando da ideia disso, Gabo foi se transbordando cada vez mais para os seus desenhos, sejam eles no papel ou no digital.

 

A vida imita a arte, mas muitas vezes a arte imita a vida também. Gabo considera que sua vida é uma comédia, portanto, faz de tudo para aproveitar as oportunidades de situações cômicas que sua rotina oferece. Entre seus atuais trabalhos, está a série de tirinhas “Finho, o doguinho”, no qual retrata situações engraçadas que já compartilhou com seu próprio cachorro. 

Juntando a personalidade forte de Finho, que só não fala para não dar recado, e sua criatividade e licença para exagerar como artista, nasceu seus quadrinhos que semanalmente, aos sábados, estampam a página voltada para isso no jornal O Povo, um trabalho que veio inusitadamente por meio do empurrãozinho de Daniel Brandão, seu professor de desenho e inspiração como ilustrador.

Além desse seu feito, Gabo pretende ampliar suas obras para outros níveis. Planos futuros já rondam seus pensamentos, uma parceria com sua namorada, Maria Clara, na qual conta com a ajuda da companheira para colorir as ilustrações que faz, uma vez que admite não ser tão bom nesse quesito, enquanto ele ficava na parte da roteirização e lineart. O objetivo maior deste projeto é contar suas histórias para o mundo e tocar as pessoas da melhor forma que sabe fazer, que é ilustrando, sejam elas enredos de romance LGBTQ+ ou de horror — ou os dois, por que não? —, mas sempre mantendo sua essência com um bom toque de humor.

Tendo inspiração em diversos quadrinhistas brasileiros, como Gabriel Lage, Paulo Moreira e Pâmela Castro, Gabo mantém-se sempre ativo, buscando melhorar sua arte, a maneira como utiliza a comédia em seus quadrinhos e as mensagens que quer passar para seu público, tal como a sua imagem que por si só é um exemplo de resistência na sociedade.

"Ser não-binário, hoje em dia, não era pra ser político, mas foi feito para ser político", Gabo afirma. Pessoas não-binárias eram para somente existir como qualquer outra, mas o fato de suas existências estarem presentes na sociedade já se torna um movimento contra a maré.

Eros Gabriel, anjo duplicado em toda sua androginia e falta de gênero, se faz Gabo, ilustradore e quadrinista, artista não-binário com grandes ideias e ideais, que sabe aproveitar das situações cômicas da rotina para achar graça e fazer os outros rirem através de suas tirinhas e ilustrações. Ele existe com sua personalidade criativa e divertida, não digo como qualquer pessoa, mas como um incrível artista.

bottom of page